O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação civil pública, com pedido de liminar, para suspender a análise e emissão de licenças ambientais pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para a repavimentação do trecho central da BR-319. A rodovia conecta Manaus (AM) a Porto Velho (RO).
O MPF alega que o direito das populações indígenas e tradicionais à consulta prévia, livre e informada, conforme prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), não foi respeitado.
A ação protocolada na Justiça Federal na última quinta-feira (14) exige que o Ibama, a União e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) elaborem um plano de mapeamento das comunidades impactadas. Este plano deve adotar uma metodologia abrangente, considerando um raio de 40 km ao redor da rodovia. Após o mapeamento, será necessário formular um plano de consulta específico para o projeto, em conjunto com as comunidades e respeitando seus protocolos próprios.
O MPF afirma que a ausência de consulta invisibilizou as comunidades tradicionais ao longo do trecho da BR-319, região considerada a entrada para a “Amazônia Profunda”, caracterizada por sua relevância ambiental e florestal. Além disso, a área enfrenta intensos impactos ambientais: em agosto de 2024, 33 terras indígenas e 24 unidades de conservação monitoradas na região registraram focos de calor, segundo o MPF.
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Histórico de omissão estatal
Desde 2005, quando começou a recuperação da BR-319, o MPF tem emitido recomendações para garantir os direitos das populações afetadas. No entanto, o órgão aponta uma “omissão sistemática” por parte do Estado brasileiro, incluindo falhas em estudos de impacto ambiental, irregularidades em audiências públicas e ausência de medidas protetivas.
Mesmo reconhecendo a necessidade de estratégias para alinhar o Plano Básico Ambiental Indígena às demandas locais, o Ibama emitiu a Licença Prévia nº 672/2022 sem realizar consultas adequadas. A Funai também identificou inconsistências nos estudos do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), mas o Plano Básico Ambiental finalizado em 2024 não contemplou todas as comunidades afetadas.
O MPF solicita que a ação seja tratada como um processo estrutural, visando à criação de planos e cronogramas integrados entre os órgãos envolvidos, com mediação judicial. Caso não haja acordo, o órgão pede a nulidade do Termo de Referência da Funai, multa diária em caso de descumprimento e uma condenação de R$ 20 milhões a título de dano moral coletivo.
A procuradora responsável pelo caso destacou que “a proteção das comunidades tradicionais e indígenas é indispensável para a preservação da Amazônia e para a garantia de direitos fundamentais”.