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Comida que dá ‘nojinho’: usos e costumes culturais marcam a forma como nos alimentamos

Hábitos gastronômicos milenares envolvem o consumo de animais em pratos típicos que assustam os olhos e o paladar dos brasileiros
11/10/25 às 20:00h
Comida que dá ‘nojinho’: usos e costumes culturais marcam a forma como nos alimentamos

A cena é clássica: dentro do Palácio de Pankot, Indiana Jones (Harrison Ford) e a namorada dele, a cantora Willie Scott (Kate Capshaw), participam de um banquete oferecido pelo marajá Zalim Singh onde garçons usando trajes e luvas nas mãos para dar um ar de sofisticação servem os pratos em tigelas e cloches (tampas) de ouro que encantam a todos os envolvidos na mesa.

Quando Singh dá sinal para começar o serviço, Willie Scott (foto abaixo) é tomada por um nojo compulsivo ao ver a cabeça de um macaco aberta e com o cérebro exposto para a degustação dos membros da corte do marajá. Para piorar, outro prato servido envolve pequenas cobras vivas nadando em uma espécie de sopa e na sobremesa olhos de animais da região.

Essa cena é uma mostra de que a gastronomia mundial é um espelho da cultura e das tradições de cada povo — e o que para uns é uma rica e apreciada iguaria, para outros pode ser motivo de espanto e nojo. O cérebro de macaco frito, uma variação do prato visto em Indiana Jones e o Templo da Perdição (1984), ainda hoje é um prato apreciado em diversas regiões da Ásia.

Cobras ou serpentes são pratos disputados a tapa na China, país mais conhecido pelo consumo deste tipo de proteína. Em Guangdong e Hong Kong, ensopados de cobra são considerados pratos revigorantes e a “sopa de cinco cobras”, que mistura carnes de diferentes espécies, é um revigorante para os sistemas de circulação e imunológico.

Mesmo no Ocidente as cobras são apreciadas, como ocorre no Sul dos Estados Unidos, na fronteira com o México, onde comer carne de cascavel empanada e frita é um prato do dia a dia, posto que lembra o frango no sabor e na textura. No Brasil, no curso de Guerra na Selva aplicados aos militares no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), em Manaus, os alunos aprendem como matar, preparar e comer carne de cobra.

Nas Filipinas, o balut — embrião de pato cozido ainda dentro do ovo — é vendido nas ruas como lanche popular (foto). Na Islândia, o hákarl, carne de tubarão curada e fermentada, tem aroma tão forte que causa rejeição imediata em quem não está acostumado.

Nos países andinos da América do Sul, o cuy, porquinho-da-índia assado também causa estranheza aos brasileiros. Agora nenhum hábito alimentar estrangeiro causa mais espanto e repulsa entre nós do que a tradição sul-coreana de comer cachorros.

Durante séculos, a carne de cachorro (chamada “gaegogi”) foi consumida principalmente no verão, por ser considerada “revigorante” e boa para enfrentar o calor. O prato mais tradicional é o bosintang, uma sopa feita com carne de cachorro, legumes e temperos fortes como pasta de soja fermentada e óleo de gergelim.

No entanto, nas últimas décadas, a prática vem sendo fortemente criticada, tanto pela nova geração de sul-coreanos, que cada vez mais veem os cães como animais de estimação, quanto por organizações de defesa dos direitos dos animais. Em 2024, a Coreia do Sul proibiu a venda e consumo da carne de cachorro e deu prazo para proprietários de matadouros para encerrarem as atividades até 2027.

Porém, ao contrário do que muitos pensam no Brasil, os sul-coreanos não comem cães de raças domésticas, como o chou chou, poodle ou shih tzu. A criação para abate e uso culinário é da espécie Nureongii, um cão de porte médio, de pelagem amarelada. O nome, inclusive, significa “amarelinho” em coreano. Ele era criado em fazendas rurais exclusivamente para consumo, de modo semelhante ao gado ou ao porco.


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E os pratos nacionais, quais são os mais estranhos?

Esses pratos da culinária internacional desafiam não apenas o olfato e o paladar, mas também os limites culturais do que chamamos de “comida”. Enquanto no Brasil muitos torcem o nariz, em outras partes do mundo esses sabores representam identidade, tradição e bravura à mesa.

Mas e os pratos nacionais, quais tem na aparência, no sabor e no aroma uma característica que espanta o consumidor a primeira vista?

No Paraná temos um bom exemplo deste tipo de cultura que cria uma gastronomia que dá “nojinho” à primeira vista. Trata-se da “Carne de onça”, um prato feito com carne crua regada a azeite e enfeitada com gema de ovo, também crua. Nenhum paranaense abre mão de uma boa carne de onça, mas e você, comeria essa iguaria?

Grosso modo, todo prato que envolve crustáceos tem uma similitude com o cérebro de macaco frito dos asiáticos. O caranguejo toc toc, por exemplo, é praticamente destruído pelo bom apreciador brasileiro, que só deixa do bicho a casca. A carne da patinha e da cabeça são consumidas em larga escala em praticamente todo o Brasil.

Na culinária baiana o vatapá é uma unanimidade nacional, mas quem observa de longe pode ter algum sentimento de repulsa por aquela massa amarelecida e untuosa enfeitada com camarões, outro crustáceo que o bom apreciador só deixa a casca e parte da cabeça. No Amazonas, o camarão é substituído por sardinha, acompanhado com pimenta.

Na Região Norte o prato típico da culinária do Pará, uma das mais celebradas do Brasil, não é para todos os gostos e olhares. Uma boa maniçoba, a versão paraense da feijoada, só é apreciada por corações fortes, uma vez que a textura e a aparência das folhas de mandioca fermentada por até sete dias não são exatamente convidativas. Quem supera esse problema, contudo, terá na boca um dos sabores mais especiais da culinária brasileira.

Exotismo escondido na culinária amazonense

Embora tenha como característica geral uma gastronomia bem “clean”, focada no peixe frito, cozido ou assado, a culinária amazonense também traz pratos que, a primeira vista, causam estranheza aos olhos e paladar de outros povos. O sarapatel de tartaruga é um exemplo. O bodó assado no tucupi é outro.

Para os mais antigos, o Iaça ou Irapuca assados na brasa exigem olhos e estômagos fortes, pois eles são lançados no fogo vivos, para que a adrenalina liberada na agonia da morte, traga um sabor especial à carne destes pequenos quelônios.

Vale lembrar que a comercialização para consumo humano tanto do Iaça, quanto do Irapuca, é proibida por lei desde os anos 1960 do século passado. A tartaruga para consumo humano é permitida desde que o animal tenha sido criado em cativeiro.