Guarda compartilhada de pets: quando o bem-estar do animal vira prioridade no fim de um relacionamento

Montagem/ Reprodução.
Hoje em dia é cada vez mais comum ver famílias que adotam animais de estimação como membros do núcleo. O amor incondicional pelo pet faz ele se tornar filho, neto e até sobrinho, em inúmeros lares. Quem nunca viu uma situação parecida com alguém próximo ou até mesmo na própria família?
Foi o caso da estudante de psicologia Beatriz Alves e Ítalo Silva, auxiliar de administração. Enquanto caminhavam em uma via na capital amazonense, encontraram um gato, abandonado ainda filhote, e resolveram levar com eles, a fim de conseguir interessados no processo de adoção. Porém, o sentimento falou mais alto, e o gatinho, nomeado de Leonardo, conquistou o coração deles e se tornou o filho do casal.
Então, com o passar do tempo, as incompatibilidades no relacionamento fizeram com que o então casal optasse pelo término do namoro e a separação definitiva, com cada um morando em casas diferentes. Mas, e o Leonardo? Como iria ficar? Mesmo com o fim da relação, o ex-casal manteve um acordo que surpreendeu familiares e amigos: a guarda compartilhada do pet.
“Leonardo se tornou parte da minha rotina desde o primeiro dia. Não fazia sentido pensar que, com o fim do namoro, um de nós perderia esse contato. A guarda compartilhada foi a forma mais justa e saudável de lidar com isso”, explicou Beatriz Alves à Rede Onda Digital.
A decisão foi tomada de forma tranquila e amigável, priorizando o bem-estar do felino e o vínculo afetivo construído com os dois tutores.
Beatriz ressaltou a importância da decisão: “A gente entendeu que o amor pelos animais não precisa terminar junto com a relação. O Leonardo trouxe alegria para nós e continua sendo parte da nossa vida, mesmo que agora em casas diferentes. Esse acordo mostra que é possível lidar com separações de maneira madura.”
Esse é um drama e um questionamento de muitos casais. Além do fim do relacionamento, lidar com a ausência do convívio diário com o pet não é uma tarefa fácil. No entanto, em caso de separação dos tutores, o que acontece com os bichinhos?
A Rede Onda Digital, conversou com um time de especialistas, para esclarecer alguns pontos em relação à guarda compartilhada de animais. A primeira delas foi: a guarda compartilhada de animais já é reconhecida pela legislação brasileira ou depende de decisão judicial caso a caso?
O advogado Cheine Araújo, contou que não existe uma lei específica com regras sobre a guarda do animal, mas isso não quer dizer que deixa de ser um momento importante e decisivo para os tutores.
“O Código Civil ainda considera os animais como “bens semoventes”. Porém, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu que é possível fixar guarda compartilhada e direito de visitas em relação aos animais. Assim, a guarda depende de decisão judicial caso a caso, mas já existe forte respaldo jurídico para ser concedida”, explicou.
Por sua vez, a advogado Allan Magalhães, complementou da seguinte forma, atualizando a discussão que ocorre no Senado, com o trâmite do Projeto de Lei (PL) N. 4/2025, que altera o Código Civil, propõe mudanças nesse cenário para considerar os animais como seres vivos sencientes e passíveis de proteção jurídica.
“O Projeto de Lei (PL 4/2025) também traz a previsão expressa de guarda compartilhada de animais como direitos dos ex-cônjuges e ex-conviventes a compartilhar a companhia e arcar com as despesas destinadas à manutenção dos animais de estimação, enquanto a eles pertencentes. Desta feita, se os ex-cônjuges ou ex-conviventes não entrarem em um acordo com relação a guarda compartilhada, o caminho para solucionar a questão é o Poder Judiciário”, observou.
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Mas, como funciona o processo judicial para estabelecer a guarda do animal? É semelhante ao de guarda de filhos ou é um procedimento diferente?
Segundo Araújo, pode ser feito dentro de uma ação de família (como divórcio ou dissolução de união estável) ou em ação autônoma de guarda de animal.
“O juiz analisa quem tem melhores condições de cuidar, o vínculo afetivo e, principalmente, o bem-estar do pet. O procedimento é semelhante ao de guarda de filhos, mas adaptado à realidade dos animais, já que o foco não está em regras do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas sim no interesse e no bem-estar do animal”, pontuou.
Porém, Magalhães ressaltou que como a lei brasileira considera os animais bens móveis, não há regulamentação sobre a guarda dos animais. O rito processual e os critérios para a guarda dos filhos são usados por analogia na guarda dos pets, mas naquilo que for compatível.
“Assim, é forte o entendimento de que há um conflito de família na definição da guarda do pet, o que é baseado na noção de “família multiespécie”, sendo a ação de divórcio ou dissolução de união estável um momento adequado para discutir essas questões, mas não necessariamente”, complementou.
Então, é possível estipular em contrato ou acordo extrajudicial como será a rotina do pet?
Ambos os advogados declaram que sim.
Magalhães: “É perfeitamente possível e até mesmo desejável. Se os tutores conseguirem firmar um acordo sobre os seus direitos e deveres em relação ao pet, e que considerem o bem-estar animal e a manutenção dos vínculos de afetividade entre o pet e seus tutores, este é o desejável, e deve ser estimulado”.
Araújo: “É permitido que os tutores façam um contrato particular ou acordo extrajudicial estabelecendo regras sobre guarda, visitas e divisão de despesas. Esse contrato pode ser registrado em cartório e, em caso de conflito, pode ser levado ao juiz para homologação”.
Com as dúvidas sanadas, como anda a vida do gatinho Leonardo? Bom, ele passa períodos alternados com cada um dos tutores, que também dividem os custos com alimentação, saúde e lazer do pet. A experiência, além de demonstrar responsabilidade, também tem servido de inspiração para amigos que acompanharam a história.
“Mais do que sobre nós, essa decisão mostra que os animais são membros da família e merecem todo cuidado e respeito”, acrescentou Beatriz.
Com isso, o pequeno Leonardo segue recebendo amor em dobro, enquanto Beatriz e Ítalo dão exemplo de maturidade e afeto ao transformar uma separação em um ato de cuidado compartilhado.
