Manoel Rodrigues Chaves Filho, de 50 anos, morador de Olinda, no Grande Recife, entrou na Justiça contra a Igreja Universal do Reino de Deus após vender sua padaria e doar R$ 31,5 mil à instituição religiosa em troca de “uma mudança positiva de vida”. Após a doação, ele alegou ter ficado desempregado, divorciado e com dívida com o colégio da filha dele.
Processo contra a igreja Universal
O processo foi aberto em 2019. Manoel, que atualmente trabalha como padeiro, pediu que o valor fosse devolvido a ele, além de uma indenização por danos morais.
Em janeiro de 2022, o juiz Carlos Neves da Franca Neto Júnior, da 2ª Vara Cível da Comarca de Olinda, deu sentença parcialmente favorável a ele. A Universal entrou com recurso, que foi negado nesta quinta-feira (20/3).
Durante a ação, o padeiro diz que passou a frequentar a Igreja Universal em março de 2017. Lá, conheceu o pastor Rodrigo Antonio, que o teria assediado a fazer a doação.
Segundo Manoel, o líder religioso afirmou que “se ele entregasse o dinheiro, iria ter uma vida completa, a mudança viria de imediato. As pessoas que estavam virando as costas para ele no momento difícil, iriam ficar surpreendidas com a prosperidade”.
O pastor teria dito que o fiel conseguiria casa e carros luxuosos, padaria própria e muito dinheiro. Um áudio anexado ao processo mostra o pastor orientando o padeiro a vender outros bens para doar à igreja.
“Agora, é o senhor vai pegar e preparar o seu sacrifício, esse valor de R$ 30 mil e tudo que vier na mão do senhor. Se tiver mais coisa, o senhor pega e fala assim: ‘vou vender, vou pegar esse dinheiro e botar num envelope'”, diz um trecho.
Outro áudio, o pastor orienta Manoel a não repartir o dinheiro com a esposa, com quem estava se divorciando.
“Não toca naquilo que é sacrifício, seu Manoel. Se o senhor tocar, sua vida não vai mudar. (…) Pega o valor, tudo o que o senhor tem, põe no altar, no sacrifício, para Deus te abençoar”, disse ele.
O autor da ação diz que repassou R$ 10 mil em cheque e R$ 21,5 mil em espécie. A doação aconteceu no estacionamento da igreja.
“Eu fiquei numa dificuldade muito grande. Tive que colocar minha filha em uma escola pública porque não tinha mais condição de pagar”, contou Manoel.
Após a doação, o homem percebeu que estava sendo enganado.
“Mostrei a foto para os membros da igreja e disse que ele estava enrolando todo mundo, enganando as pessoas”, lembra. “Eu não acho que ele era apenas um pastor ruim dessa igreja. Acho que todos eles são instruídos a enganar as pessoas”.
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Igreja Universal se defende
A defesa da Igreja Universal argumentou que não há provas do repasse do dinheiro em espécie e que a Igreja está amparada no exercício da liberdade de organização religiosa ao estimular a doação, não tendo havido coação. A igreja argumenta ainda que se trata de “flagrante arrependimento tardio” por parte de Manoel.

Em nota à imprensa, a igreja Universal declarou que a Constituição Federal e o Código Civil têm normas claras que garantem a liberdade de pedir e fazer doações, protegendo de supostos “doadores arrependidos”.
Confira na íntegra a nota da Igreja Universal do Reino de Deus:
Nenhuma igreja ou instituição assistencialista que depende de doações voluntárias poderia existir se a lei não a protegesse de supostos “doadores arrependidos”. Justamente por essa razão, a Constituição Federal (p.e.: art. 5º, II, IX, XVII e XXXVI) e o Código Civil (p.e.: art. 538 da Lei nº 10.406) têm normas claras que garantem a liberdade de pedir doações, bem como de fazê-las.
Vale ressaltar, também, que o autor desta ação é uma pessoa esclarecida e totalmente apta e capaz de assumir suas próprias decisões, sendo conhecedor dos rituais litúrgicos — até porque, já havia realizado ofertas voluntárias em outros momentos — ao longo do período em que frequentou a Igreja.
Dito isso, a Igreja Universal do Reino de Deus reitera que, em um país laico, como o Brasil, é vedado qualquer tipo de intervenção do Estado — incluindo, do Poder Judiciário — na relação de um fiel com a sua igreja (p.e.: CF, art. 19, I; art. 5º, VI). E, por fim, informa que a Instituição não teve chance de produzir provas para contrapor o autor da ação em primeira instância. Exatamente por isso, apelou ao Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco — totalmente convicta de que a Justiça e a verdade prevalecerão.