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Justiça Federal suspende contrato que dava privilégios a empresas na Terra Indígena Vale do Javari

Duas empresas estrangeiras e uma brasileira tinham direito exclusivo para comercializar, por exemplo, créditos de carbono gerado pela floresta da Terra Indígena
21/10/25 às 10:17h
Justiça Federal suspende contrato que dava privilégios a empresas na Terra Indígena Vale do Javari

A Justiça Federal de Tabatinga suspendeu, de forma liminar, o contrato de comercialização de “Soluções Baseadas na Natureza” (SbN) firmado entre a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e as empresas estrangeiras Biotapass S. L. e Cooperativa de Trabajo Integral Biota Ltda. e a brasileira Comtxae Serviços Educacionais, Cultura e Tecnologia Ltda.

A decisão atendeu a pedido do Ministério Público Federal (MPF) em ação civil pública que questiona a legalidade do acordo. Segundo o MPF, o contrato foi firmado sem autorização da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e sem a realização da Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI), prevista na Convenção n.º 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

De acordo com a decisão, o contrato — firmado em dezembro de 2022 — conferia às empresas direitos exclusivos sobre atividades ambientais dentro da Terra Indígena Vale do Javari, além de cláusulas que poderiam restringir o uso tradicional da terra, permitir o uso indevido de imagens dos povos indígenas e colocar em risco comunidades isoladas.

A magistrada Fernanda Silva Schorr destacou que o acordo apresentava indícios de ilegalidade e ilegitimidade, pois não houve consenso entre as comunidades indígenas envolvidas e tampouco a devida consulta às populações afetadas. Também foram apontadas cláusulas que poderiam conceder às empresas acesso irrestrito ao território indígena, inclusive com acompanhamento remoto de ecossistemas, o que representaria risco à soberania nacional.

Com a decisão, a Justiça determinou a suspensão imediata de todos os efeitos do contrato e a paralisação de qualquer atividade de comercialização ambiental ou uso de imagens relacionadas à Terra Indígena Vale do Javari. As empresas também deverão preservar toda a documentação e dados digitais ligados ao contrato e ficam sujeitas a multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

A Terra Indígena Vale do Javari, localizada no extremo oeste do Amazonas, abriga diversos povos indígenas, incluindo comunidades isoladas e de recente contato, sendo uma das maiores e mais sensíveis áreas protegidas do país.


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Univaja afirma que houve indução ao erro

A União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) afirmou, em nota enviada à Rede Onda Digital, que não reconhece a legitimidade do contrato firmado com três empresas para a comercialização de Soluções Baseadas na Natureza (SBN) e concorda com a decisão da Justiça Federal de suspender a validade do contrato.

A direção da entidade, formada pela união de oito associações comunitárias que representam as etnias do Vale do Javari, atribuiu ao grupo conhecido na Amazônia como “Cowboys do crédito de carbono” a cooptação de lideranças para a assinatura do contrato que concede o direito de uso exclusivo dos SBNs às empresas Comtaxae (brasileira), Biotapass (espanhola) e Biota (argentina). Os créditos de carbono gerados pela floresta em pé localizada na Terra Indígena Vale do Javari são classificados como SBNs.

O que são SBNs?

A definição da Comissão Europeia para SbN declara que são “soluções inspiradas e sustentadas pela natureza, que são economicamente viáveis, proporcionam benefícios simultaneamente ambientais, sociais e econômicos e ajudam a aumentar a resiliência; estas soluções trazem um número maior e mais diversificado de características e processos naturais e da natureza às cidades, paisagens terrestres e marinhas, através de intervenções adaptadas aos locais, eficientes em termos de recursos e sistêmicas”.

A TI Vale do Javari em números:

  • Sete povos vivem na TI e mantém contato com a sociedade;
  • 16 grupos indígenas vivem em isolamento voluntário, sendo os Korubos, os índios caceteiros, os mais conhecidos;
  • 74 aldeias
  • 6 mil indígenas de sete povos com contato;
  • 8 organizações de base, todas reunidas na Univaja; Organização Geral dos Mayuruna (OGM), Associação Kanamary do Vale do Javari (Akavaja), Associação de Desenvolvimento Comunitário do Alto Rio Curuçá (Asdec), Organização das Aldeias Marubo do Rio Ituí (Oami), Associação Indígena Matis (Aima), Cooperativa de Preservação Etnoambiental Autônoma dos Kanamari da Aldeia São Luís (Copeaka), Associação Ibá Kulina do Vale do Javari (Aikuvaja) e Associação Marubo de São Sebastião (Amas)
  • 8,5 milhões de hectares de floresta protegida