Os desastres climáticos no Brasil aumentaram 250% nos últimos quatro anos (2020–2023), em comparação com os registros da década de 1990, revela estudo lançado pela Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica. O levantamento tem coordenação do Programa Maré de Ciência da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em parceria com a Fundação Grupo Boticário.
O estudo, que usou dados públicos extraídos do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID) do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, considerando o período de 1991 a 2023, também analisou dados de temperatura média do ar e da superfície oceânica dos últimos 32 anos. Tudo isso com base em informações da agência europeia Copernicus, obtidos por meio da plataforma Climate Reanalyzer.
Segundo os pesquisadores, para cada aumento de 0,1°C na temperatura média global do ar, ocorreram mais 360 desastres climáticos no Brasil. No oceano, para cada aumento de 0,1°C na temperatura média global da superfície oceânica, foram registrados mais 584 eventos extremos no país.
“Quando os dados de 2024 forem consolidados, haverá a confirmação da escalada de desastres climáticos nos anos mais recentes. O levantamento aponta que foram registrados 6.523 desastres climáticos em municípios brasileiros na década de 1990, enquanto, no período de 2020–2023, foram registrados 16.306 eventos”, dizem os pesquisadores.
Segundo o levantamento, o Brasil teve 64.280 desastres climáticos desde 1990, e há aumento, em média, de 100 registros por ano. Nos primeiros dez anos monitorados, foram 725 registros por ano. De 2000 a 2009, 1.892 registros anuais; de 2010 a 2019, 2.254 registros anuais e, nos últimos quatro anos (2020 a 2023), já são 4.077 registros por ano.
O professor Ronaldo Christofoletti, do Instituto do Mar da Unifesp, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza e um dos coordenadores do estudo, disse que o objetivo do levantamento é contribuir para que a sociedade conheça, debata e pense em soluções. O estudo incentivaria a tomada de decisão e as mudanças de comportamento necessárias, tanto em nível individual quanto institucional, para reduzir os impactos climáticos e garantir um futuro sustentável para o Brasil.
A pesquisa mostrou ainda que 5.117 municípios brasileiros reportaram danos causados por desastres climáticos entre 1991 e 2023, representando 92% dos municípios do país. As principais ocorrências foram secas (50% dos registros), seguidas por inundações, enxurradas e enchentes (27%) e tempestades (19%).
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Oceano
Desde março de 2023, o oceano teve aumento de temperaturas de cerca de 0,3°C a 0,5°C, fenômeno que tem agravado eventos extremos, como furacões e inundações, afetando milhões de pessoas e impactando profundamente os ecossistemas. Entre os exemplos, estão as inundações no Rio Grande do Sul e as secas no Centro-Oeste, em 2024.
Christofoletti destacou que o oceano é fundamental para a regulação climática global e que seu aquecimento contínuo evidencia os impactos crescentes da crise climática no sistema terrestre.
“Isso é muito preocupante, considerando que, ao longo dos últimos 40 anos, o oceano aqueceu cerca de 0,6°C. Esse aquecimento abrupto e prolongado ameaça o equilíbrio de um sistema que cobre 70% do planeta. O oceano, nesse nível de aquecimento, intensifica os eventos climáticos extremos que impactam diretamente milhões de pessoas”, disse.
Quando analisadas as consequências econômicas e sociais, o cenário indicou que, entre 1995 e 2023, os prejuízos econômicos no Brasil atingiram R$ 547,2 bilhões. Nos primeiros quatro anos da década de 2020, as perdas somaram R$ 188,7 bilhões, 80% do total registrado em toda a década anterior (2010–2019) e corresponde a 0,5% do PIB nacional acumulado nos últimos quatro anos.
As projeções baseadas no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e na taxa atual de registros de desastres, mostram que os números podem aumentar nas próximas décadas. No cenário mais otimista, até o final do século, no qual as metas do Acordo de Paris para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C sejam cumpridas, o Brasil poderá registrar até 128.604 desastres climáticos entre 2024 e 2050, o dobro do total observado nas últimas três décadas.
No cenário mais pessimista, no qual o aquecimento do planeta ultrapassa 4°C, o número de desastres pode chegar a quase 600 mil ocorrências até 2100, nove vezes o registrado entre 1991 e 2023.
Conforme o estudo, mesmo no menor cenário, o Brasil pode sofrer um impacto de R$ 1,61 trilhão até 2050. Se o cenário pessimista se concretizar, os custos poderão ultrapassar R$ 8,2 trilhões até o final do século, 15 vezes o total observado nas últimas décadas.
Para a pesquisadora envolvida no estudo e gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário, Janaína Bumbeer, apesar das projeções negativas, ainda há tempo para agir. Segundo Janaína, além de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, é essencial buscar a resiliência das comunidades e a adaptação às novas condições climáticas.
“Nesse sentido, as soluções baseadas na natureza são ferramentas eficazes para fortalecer a resiliência de cidades costeiras, enfrentando desafios ambientais, sociais e econômicos de forma integrada. A recuperação de manguezais e dunas, por exemplo, está entre as soluções verde-azuis, que promovem a adaptação ao ambiente urbano e costeiro, aumentando a resiliência contra eventos climáticos extremos e construindo cidades mais saudáveis e sustentáveis”, afirmou.
A pesquisadora ressaltou que o aumento da temperatura global, além de ampliar os eventos extremos, provoca o aumento nos custos de energia e alimentos, a escassez hídrica e o aumento de doenças relacionadas ao calor, como a dengue.
*Com informações da Agência Brasil