“Ainda há moradores aqui!”. A frase escrita numa placa de metal na entrada do Flexal, uma comunidade localizada no bairro Bebedouro, em Maceió, reflete o drama dos moradores que permanecem residindo numa região em que todo o entorno está inabitado.
São cerca de 3 mil pessoas que vivem ilhadas socioeconomicamente nas comunidades Flexal de Baixo e Flexal de Cima desde 2019, quando a Braskem iniciou os acordos para compra de mais de 550 imóveis e realocação de mais de 50 mil moradores das regiões afetadas.
Ao todo, cinco bairros de Maceió foram desocupados à força devido ao afundamento do solo causado pela mineração de sal-gema pela petroquímica Braskem, que atuava em 35 minas subterrâneas, localizadas abaixo dos bairros do Bebedouro, Bom Parto, Pinheiro, Mutange e Farol.
Quem ficou morando na região, nas margens da área aceita oficialmente como afetada pelo perigo de afundamento do solo, vive um drama agravado neste momento, quando há risco iminente do colapso de uma das minas em uma enorme cratera e a capital alagoana está em situação de emergência.
Hoje, no entorno dos Flexais, ficam regiões que em muito se parecem com “bairros fantasmas”, pois toda a população do entorno foi realocada. Mesmo assim, boa parte dos moradores permanece lá, isolados socialmente.
Maurício Sarmento, é servidor público e morador da rua Faustino Silveira, conhecida como “Flexal de Cima”, há 45 anos e se vê prejudicado pelo ilhamento socioeconômico, além de forçado a se retirar da sua casa por questões de segurança, considerando o risco iminente de colapso da mina 18.
Leia mais:
VÍDEO: Moradores próximos a mina de Maceió protestam por relocação
Maceió registra novo tremor em região explorada por mineradora
Desde a última quinta-feira (30/12), quando a Defesa Civil municipal emitiu o alerta máximo para o risco de colapso da mina que está na região do antigo campo do CSA, no Mutange, o órgão tem recomendado que as famílias se abriguem em escolas municipais por precaução.
“Tô saindo de forma voluntária, porque para a gente não foi oferecido nada. A gente vem lutando para que a Braskem possa indenizar as pessoas de forma justa e que a prefeitura, juntamente com a Braskem, realoque essas pessoas. É o que a gente vem pedindo há anos e sequer foi respeitado isso”, relata o representante comunitário, Maurício Sarmento.
O morador também informou que ao longo dos anos foram enviados ao poder público, Justiça e Braskem diversos requerimentos para que houvesse a realocação da população e indenização de forma justa, mas houve resposta satisfatória.
“As respostas que nós víamos pela imprensa era que aqui não tinha nada [de risco] e agora tá aí, pedindo para a gente sair por prevenção”, reclama ele.
Além da vida social, outro aspecto que foi prejudicado com a exploração de sal-gema pela Braskem foi a vida econômica. Muitos moradores que habitam na região dos Flexais têm a pesca na lagoa Mundaú, que margeia as bordas da comunidade, como principal atividade de sustento. Esse é o caso do pescador Leandro Alves, que reside na localidade há 41 anos.
Segundo ele, a atividade pesqueira tem ficado mais difícil de uns quatro anos para cá, em que ele não consegue lucrar com a venda de peixes como antes.
“Os peixes que tinham antigamente, hoje não tem mais, não. Mudou muito. (…) Acho que tem alguma coisa na água que o peixe vem e volta, ele não tá mais ficando como antigamente, que ele vinha e desovava, fazia a morada dele. Hoje não, ele [o peixe] vem, sente que a água tá diferente e volta para o mar”, explica o pescador.
Mesmo com todas as dificuldades impostas pela situação de isolamento, Leandro revela que seu desejo mais profundo era poder permanecer na região que mora desde criança.
“Eu não queria sair daqui, não. Eu nasci e me criei aqui, minha infância foi toda aqui. Em outros lugares tem violência, aqui não tem, não. Do jeito que as coisas estão, tá ruim, mas, se fosse da minha escolha, eu não saía”, expõe o pescador.
*com informações do Metrópoles.